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A 13 de Maio de 1776, em local próximo da extinta Santo António de Arenilha, foi inaugurada uma povoação imaginada a partir do nada, cuja construção havia sido ordenada pelo Marquês de Pombal nos finais de 1773. A escolha do local para a implantação da nova Vila, exemplo maior do Iluminismo, resultou de uma estratégia económica, política e territorial de afirmação do Estado português na fronteira do Rio Guadiana. Com uma malha urbana pensada em função do conceito de vila-fábrica, e norteada por princípios genuinamente práticos, Vila Real de Santo António, assume-se, simultaneamente como materialização do antigo modelo da cidade ideal, utopia urbanística de funcionalidade e pragmatismo.
Dois eixos marcam a estratégia de organização urbana da nova «vila regular»: o Eixo Espiritual, centrado na Igreja e no Cemitério, e o Eixo do Poder, num alinhamento perfeito entre a Alfândega, a Casa da Câmara, o Obelisco e o Quartel (atual Centro Cultural António Aleixo).

A fachada de Vila Real de Santo António é constituída por uma série de sete quarteirões compostos pela Alfândega, ao centro, e pelas Sociedades de Pescarias, e rematados por torreões a norte e a sul, com uma evidente função de se impor face a Espanha.
A Alfândega, localizada no eixo do quarteirão central e ocupando um duplo quadrado de 50 palmos por 100 de fundo, foi o primeiro edifício a ser construído e é simbolicamente o mais relevante. Com exceção óbvia da Igreja, é o único edifício que não se repete na arquitetura da Vila. Detendo a função alfandegária de controlo de entradas e saídas de mercadorias, demarcava claramente uma fronteira com a outra margem do Rio Guadiana. Inserida no Eixo do Poder, num elaborado jogo simbólico e formal, o centro da porta de entrada da Alfândega, encimada pelas Armas do Reino de Portugal, estabelece, numa linha imaginária, uma ligação com o centro do edifício da Câmara, do Obelisco e do antigo Quartel.

O Rio Guadiana define uma linha de fronteira, união de duas margens, via de comunicação de rotas comerciais e culturais e de entrada às influências das civilizações antigas. Sendo o controlo das pescas o principal objetivo da fundação de Vila Real de Santo António, a nova Vila foi planeada estrategicamente como um todo orgânico e funcional que se desenvolve a partir do rio. Assim, por força régia e decisão política, no combate à evasão fiscal e à defesa dos recursos pesqueiros, a nova Vila nasce junto à foz na margem direita do Rio Guadiana, ostensivamente virada a Espanha. Nos finais do século XIX e inícios do século XX representa um importante porto piscatório, associado à transformação industrial de pescado e à construção e reparação naval, detendo ainda um papel de relevo no transporte e exportação de minério proveniente da Mina de S. Domingos.

Os Torreões são edifícios morfologicamente distintos na frontaria da Vila. Ligeiramente avançados relativamente às Sociedades, detêm um grande significado urbanístico por delimitarem simetricamente a Vila a norte e a sul. De planta quadrada, ocupam uma área de 60 por 60 palmos.

Popularmente conhecida por Largo da Bica, dispunha de uma fonte ao centro que na sua origem justificava a denominação de Praça da Fonte. A norte, simetricamente, localiza-se a Praça da Estalagem. Estas duas praças (ou largos) encontram-se separadas por dois quarteirões e pela praça central. Estrategicamente colocadas e definidas no plano fundacional, remontam à cidade ideal, numa lógica geométrica de urbanismo perfeito.
O topónimo atual presta homenagem à poetisa Lutgarda Guimarães de Caires, natural de Vila Real de Santo António.

As Sociedades de Pescarias são organizadas por doze unidades industriais que se alinham na fachada da Vila. Com dois pisos, no rés-do-chão destes edifícios funcionavam os escritórios, e o piso superior era destinado à habitação. Nas traseiras situavam-se salgas com funções industriais de transformação do pescado. Aqui o peixe era escamado, salgado e colocado em barricas de estiva, durante duas semanas para a eliminação de gorduras, e posteriormente transportado para os Armazéns fronteiros.
As fachadas destes edifícios repetem o mesmo modelo compositivo: um largo portão e duas janelas equidistantes de cada lado. O portão central está alinhado a eixo com a porta principal da Sociedade, frente ao rio, facilitando o circuito do pescado.

A Casa da Câmara localiza-se na antiga Praça Real. Sede do poder municipal, constituía-se como edificação obrigatória, porquanto as funções administrativas e judiciais estavam reunidas no município. No seu conjunto, o edifício era constituído pela Câmara, Cadeia para mulheres e homens, Casa do Governo, Cavalariça, Palheiro, Celeiro e Mercado Público. Depois de um violento incêndio ocorrido em 1908, o edifício viria a ser reconstruído cerca de quatro anos depois com base num projeto que subverteu a arquitetura original.
O atual edifício é o resultado da obra de reabilitação de 2009, que repôs a traça e altimetria original do edifício, e devolveu à praça a métrica do plano fundacional.

Antiga Praça Real, hoje denominada Praça Marquês de Pombal, ocupava o centro cívico e comercial em pleno Século das Luzes. Nela se localizavam a Casa da Câmara e Cadeia (a nascente), o Corpo da Guarda (a sul) e a Igreja (a norte). A Praça representa um quadrado no qual as linhas radiais e contrastadas da calçada, executada no final do século XIX, tomam a direção do obelisco que define a sua centralidade. Nos quatro quarteirões de dois pisos que a compõem, o rés-do-chão era reservado a comércio e o primeiro andar a habitação. À exceção do edifício que ladeia a Igreja pelo lado nascente, todos os restantes mantêm a traça e volumes originais. Os quatro torreões homólogos, com duplo telhado à Mardel, delimitam as diagonais do quadrado formado pela Praça.
O Obelisco ocupa o centro geométrico da antiga Praça Real. Símbolo do poder régio e da urbanidade, é dedicado ao rei D. José I, cuja inscrição testemunha o empenhamento real na edificação da Vila. Perfeitamente enquadrado no desenho urbanístico da praça, conserva proporções e relações harmónicas com a fachada da Igreja. Uma esfera armilar coroada, herdado da época dos descobrimentos, serve de remate ao monumento.

A Igreja Matriz, de nave única e planta retangular, tem capela-mor quadrada e torre sineira.
A fachada principal deste templo é composta por duas formas geométricas: o quadrado e o triângulo. O frontão que encima o portal tem um pormenor decorativo Barroco.
Possui um importante património artístico, destacando-se os retábulos e capelas laterais do século XVIII, de talha dourada ao gosto Rococó, e a escultura de Nossa Senhora da Encarnação, da segunda metade do século XVIII, atribuída à oficina do escultor português Machado de Castro. A Igreja está alinhada no Eixo Espiritual com o primeiro Cemitério moderno português que, por razões de saúde pública, foi implantado fora da zona urbana.

Os topónimos originais de Vila Real de Santo António datam de 1774-1776, o que significa que, tal como a planta da Vila, foram programados na origem. Estabelecem uma hierarquia entre as principais figuras da família Real Portuguesa, que dão nome aos diferentes arruamentos patrocinando, simbolicamente, a construção régia da Vila. Assumindo o predomínio de um poder estatal sobre o tradicional poder espiritual, apenas três ruas são apadrinhadas por figuras ligadas à religião. A figura do Rei está diretamente representada na denominação da própria Vila Real, bem como na Praça, onde se ergue o Obelisco. A Rainha D. Mariana Victória de Bourbon, mulher de D. José I, dava nome à rua principal, designada por Rua da Rainha (atual Avenida da República). O topónimo da Rua da Princesa, por sua vez, foi atribuído em honra da filha primogénita do rei, futura Rainha Dona Maria I, e as Ruas do Infante e do Infante D. João prestavam homenagem aos dois filhos da princesa herdeira. As restantes filhas e neta do monarca português estavam igualmente representadas na toponímia. Nos extremos sul, oeste e norte, como que formando uma cintura espiritual em torno da Vila, localizavam-se a Rua de S. Sebastião, a Rua Real de S. José e a Rua de Santo António. 

O antigo Quartel militar é colocado na linha do Eixo do Poder, alinhada com o Obelisco, a Casa da Câmara e a Alfândega. Exteriormente era igual às casas térreas. Destinado a mercado público no século XX (1925), o edifício instala atualmente o Centro Cultural António Aleixo, em homenagem ao poeta nascido em Vila Real de Santo António.

Antiga Fábrica de produção de pão, ocupava a totalidade do quarteirão, distribuído por áreas de preparação da farinha, o forno, o quintal com palheiro e a residência do administrador. Mais tarde, no topo sul do quarteirão, é adaptada a Sede de Estação dos Correios e Telégrafos. Atualmente funciona como quartel da Guarda Nacional Republicana.

Antiga Praça da Estalagem, é popularmente conhecida por Largo da Forca. Dispunha de um poço público e de um pelourinho, removido aquando da revolução liberal de 1820.
De planta quadrada de 100x100 palmos, o centro da praça está perfeitamente alinhado com a Igreja e o Cemitério (que se situa no final da rua, a norte), e a sul está simetricamente alinhado com a Praça da Fonte.
O topónimo atual presta homenagem ao poeta António Aleixo, natural de Vila Real de Santo António.

Dos quarenta e um quarteirões que formam a planta da Vila, vinte e cinco são de casas térreas, destinadas a habitação. Cada quarteirão era constituído por dez unidades residenciais, num sistema modular ritmados pelos vãos de porta e janela. Este sistema poderia apresentar variações internas decorrentes das diferentes funcionalidades (residência, comércio, oficina, ou quartel), porém sem alterar a métrica.